sábado, 18 de maio de 2013

FÁBULA: ORIGEM E CARACTERÍSTICAS



        
         A fábula constitui um gênero literário bastante específico: trata-se de uma narrativa curta, cujas personagens, em geral, são animais, podendo eventualmente ser pessoas ou objetos inanimados. Essas histórias têm sempre uma finalidade didático-moral.

ORIGEM DA FÁBULA

De origem anterior à Era Cristã, é provável que a fábula tenha surgido espontaneamente entre diferentes povos, de diversos continentes (embora a maioria dos estudiosos aponte o Oriente como seu berço). Está associada à tradição oral e popular: a palavra latina fabula significa “conversação, relato” e deriva do verbo far, o qual, por sua vez, vem do grego phaó, “dizer, contar algo”, que quer dizer “falar”.
As primeiras fábulas conhecidas da literatura ocidental vêm da Grécia, contadas por Esopo, supostamente um escravo que teria vivido por volta do século VI a.C., mas cuja existência nunca foi historicamente comprovada, apesar de Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.), Aristófanes (c. 447 a.C.-385 a.C.) e Platão (c. 427 a.C.-347 a.C.) terem feito referências a seu nome. Suas fábulas foram reunidas pelo filósofo Demétrio de Falero (c. 350 a.C.-280 a.C.), no século IV a.C., e são referência até a atualidade.
No século I a.C., em Roma, o filho de escravos Fedro ( 30/15 a.C.-44/50 d.C.) pôs no papel muitas das fábulas de Esopo, estilizando-as formalmente ao escrevê-las em versos. Ele ainda criou outras tantas, mas com um tom mais amargo que o das fábulas gregas. Na Idade Média, além das fábulas greco-latinas, outras de origem oriental (Índia, China, Pérsia, entre outros países), adaptadas das traduções árabes pela prosa latina, foram disseminadas pela Europa sob o nome de Ysopets.
No século XVII, na França, a fábula ganha seus contornos definitivos na literatura ocidental, pelas mãos de Jean de La Fontaine (1621-1695). Ao escrever ou reescrever fábulas em forma de poemas narrativas curtos, La Fontaine devolveu-lhes o caráter literário e imprimiu um novo pensamento filosófico ao seu conteúdo. Em tom de crítica ou de sátira, empregando como denominador comum uma moralidade, o fabulista francês expunha as injustiças, os vícios e as misérias de seu tempo.
Assim, as fábulas acabaram por moldar-se às sociedades em que foram cultivadas, refletindo a cultura e denunciando problemas de vários tipos.
Em língua portuguesa, destaca-se o poeta lusitano Bocage (1765-1805), conhecido por sua veia satírica, que tanto traduziu para o português como criou fábulas, nos fins do século XVIII. No Brasil do século XX, Monteiro Lobato foi o escritor que mais seguiu a tradição esopiana. Ao reescrever ou criar novas fábulas, adicionou-lhes comentários feitos pelas famosas personagens de suas narrativas infanto-juvenis. No século XXI, o autor que mais cultiva o gênero é Millôr Fernandes (1923-), que, desde 1963, lança suas Fábulas fabulosas em livros:

Há dois dias o caracol galgava lentamente o tronco da pitangueira, subindo e parando, parando e subindo. Quarenta e oito horas de esforço tranquilo, de caminhar quase filosófico. De repente, enquanto ele fazia mais um movimento para avançar, desceu pelo tronco, apressadamente, no seu passo fustigado e ágil, uma formiga-maluca, dessas que vão e vêm mais rápidas que coelho em desenho animado. Parou um instantinho, olhou zombeteira o caracol e disse: “Volta, volta, velho! Que é que você vai fazer lá em cima? Não é tempo de pitanga”. “Vou indo, vou indo” - respondeu calmamente o caracol.
- Quando eu chegar lá em cima vai ser tempo de pitanga.
Moral: no Brasil não há pressa!

(“O caracol e a pitanga”. Millôr Fernandes.)


CARACTERÍSTICAS DA FÁBULA
A fábula estabelece um entrelaçamento entre dois planos de significados: o denotativo, ou usual, e o conotativo, ou figurado. No denotativo, tem-se uma historieta protagonizada por animais, como lobos, leões e formigas. Entretanto, esses animais têm atitudes e apresentam características e estados de espírito típicos dos seres humanos, o que desencadeia um segundo plano: o conotativo.
Outras características das fábulas são:
  • Brevidade;
  • Foco narrativo em terceira pessoa;
  • Predominância de diálogos e sequências narrativas;
  • Animais antropomorfizados como protagonistas;
  • Referência às personagens no título;
  • Unidade de ação, tempo (indeterminado) e espaço;
  • Intenção crítica e satírica;
  • Objetivo pedagógico, ético ou moral.
Na fábula a seguir, traduzida diretamente do grego, a maioria das características dessa forma literária está presente.

Certa manhã, um fazendeiro descobriu que sua gansa tinha posto um ovo de ouro. Apanhou o ovo, correu para casa, mostrou-o à mulher, dizendo: “Veja, estamos ricos!” Levou o ovo ao mercado e vendeu-o por um bom preço. Na manhã seguinte, a gansa tinha posto outro ovo de ouro, que o fazendeiro vendeu a melhor preço. E assim aconteceu durante muitos dias. Mas, quanto mais rico ficava o fazendeiro, mais dinheiro queria. E pensou: “Se esta gansa põe ovos de ouro, dentro dela deve haver um tesouro!” Matou a gansa e, por dentro, a gansa era igual a qualquer outra.
Quem tudo quer, tudo perde.

(“A gansa dos ovos de ouro”, Esopo. )


(Enciclopédia do Estudante – Redação e Comunicação, Augusta Carvalho Moraes e outros, p.100)